quarta-feira, 25 de maio de 2011

Urgência do 109º CPTA ou Providência do 131º CPTA?

Após a revisão constitucional de 1997, o legislador administrativo viu-se obgrigado em matéria de direitos, liberdades e garantias, a adoptar, em conformidade com a Lei Fundamental, um novo meio processual, com vista a consagrar o principio da tutela jurisdicional efectiva preceituado no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa (CRP) , nascendo, o processo urgente de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias do artigo 109º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).
O artigo 109º CPTA, constitui um processo urgente principal em matéria de protecção de direitos, liberdades e garantias.

Os processos urgentes principais, são processos autónomos, caracterizados por uma tramitação acelerada ou simplificada, considerando que estão em jogo questões/situações cuja resolução à partida deve ocorrer num “tempo curto” , não compatível com o tempo considerado normal para a generalidade dos
processos.
Estes processos, ao contrário dos cautelares, decidem definitivamente o mérito da causa,ou seja, desembocam em decisões judiciais definitivas quanto ao seu mérito, dada obviamente a celeridade com que no caso, se impõe alcançar a justa composição de todos os interesses envolvidos.
Por sua vez, a tutela cautelar , é caracterizada pela sua acessoriedade ou instrumentalidade face ao processo principal, pretendendo-se que através de medidas conservatórias ou antecipatórias, seja provisoriamente regulada a situação em termos de se poder assegurar a utilidade da sentença em tempo dito normal.

A relação entre processos urgentes e providências cautelares pode vislumbrar-se, sobretudo, no âmbito do artigo 109º CPTA, que no seu nº1 remete para o artigo 131º do CPTA, transmitindo uma ideia de subsidiariedade entre ambos os artigos e ambas as formas de tutela processual em sede de contencioso administrativo.

A doutrina questiona-se, todavia, ainda que a letra da lei pareça clara, se o espiríto do diploma legal proporciona uma verdadeira subsidiariedade entre ambos os meios de tutela administrativa ou se pretende, ainda que com uma redacção algo infeliz, estabelecer uma alternatividade entre ambas as acções processuais.

Segundo o artigo 109º CPTA, o recurso ao processo urgente de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias exige ,desde logo, como pressuposto
a urgência da decisão para evitar a lesão ou inutilização do direito. Simultaneamente, exige, ainda, que no caso concreto, não seja de facto possível ou suficiente para assegurar o exercício desses direitos, o decretamento provisório de uma providência cautelar,segundo o disposto no artigo 131º.
O requerente da intimação terá que alegar e provar (ainda que de forma sumária) que só a procedência do pedido de intimação lhe proporcionará a plenitude do exercício do seu direito, demonstrando assim a indispensabilidade da intimação, face ao caso concreto.

Assim, ao contrário, do que seria de esperar face ao supracitado, o meio urgente, concretizador da tutela efectiva dos direitos fundamentais, não surge como via principal face á defesa dos direitos, liberdades e garantias de todos e cada um, parecendo estar sempre dependente, na sua aplicação, da não verificação da possibilidade de recurso a uma acção administrativa comum ou especial, conforme o caso, “coligada” com uma acção cautelar, destinada a salvaguardar os direitos em apreço.

Todavia, tal não é nem poderá ser tão linear quanto a letra da lei nos faria acreditar.
Ainda que a providência cautelar do 131º surja como o meio defesa preferencial, a verdade é que, será sempre necessário analisar o caso concreto e perceber o que se pretende com a acção colocada, pois muitas vezes a providência cautelar poderá ser utilizada num sentido e com um objectivo díspare da sua própria natureza, sendo instaurada como forma de obtenção de uma decisão definitiva, que uma vez proferida, fará com que não exista qualquer interesse no seguimento de um processo de reconhecimento de direitos principal.
Lançar mão desta subsidariedade do 109º do CPTA para fazer da providência cautelar uma forma de obtenção de uma decisão de mérito, em detrimento do processo urgente, seria confundir os papéis que cada uma das acções possui no nosso contencioso administrativo, desvirtuando o que o legislador pretendera ao criar este elo de ligação entre ambas as tutelas jurisdicionais de direitos, liberdades e garantias de forma célere.
Assim, sempre que esteja em causa urgência na decisão, mas a decisão pretendida seja uma decisão de mérito, uma decisão que, uma vez proferida, não confira qualquer interesse no prosseguimento de uma outra acção dita principal, não poderá ser nunca, a providência cautelar o meio de agir, não se podendo nunca equacionar como legítimo o recurso á última parte do nº1 do artigo 109º do CPTA de modo a afastar a acção urgente de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias.

O processo urgente do 109º do CPTA funcionará, segundo o exposto, em alternatividade, mais do que subsidiariedade pura com o artigo 131º do CPTA ou, até mesmo, com qualquer providência cautelar específica destinada a tutela de direitos, liberdades e garantias, pois será possível ser o processo urgente, á luz do caso concreto, o único meio processual utilizável e admissível á satisfação da pretensão do requerente.
Caminhará, assim, a urgência do 109º do CPTA lado a lado com a provisoriedade do 131º do CPTA, não se encontrando sempre, ao contrário do que a redacção legal suscitaria na retaguarda desta última.

Bibliografia:
Vieira de Andrade, “A Justiça Administrativa”, Almedina, 2008
“Comentário ao Código de Processo dos Tribunais Administrativos”, Almedina, 2005
Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Cadilha, “Comentários ao Código de Processo dos Tribunais Administrativos”

Diana Pinto
Nº17257

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