Decorre do princípio da tutela jurisdicional efectiva a admissibilidade de cumulação de pedidos no nosso ordenamento jurídico (artigo 268º/4 CRP).
Assim, ao invés de intentar várias acções para obter protecção dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, o particular pode intentar apenas uma, onde cumula vários pedidos, ainda que estes possam ter diferentes causas de pedir.
Mas mediante que requisitos pode o particular fazê-lo?
É o artigo 4º CPTA que estabelece os critérios gerais da cumulação de pedidos. São apenas aqueles que dizem respeito aos elementos materiais de conexão (conexão objectiva). Haverá então conexão objectiva nas situações elencadas no nº1:
• quando exista identidade da causa de pedir;
• quando exista uma relação de prejudicialidade ou dependência;
• em caso de apreciação dos mesmos factos;
• em caso de interpretação e aplicação dos mesmos princípios e regras de direito.
Na concretização do nº1, vem o nº2 fornecer um elenco exemplificativo das situações possíveis de cumulação de pedidos (as quais não cabe aqui elencar).
A cumulação pode ser simples, alternativa ou subsidiária, conforme refere o Prof. Miguel Teixeira de Sousa, conforme o autor pretenda a procedência de todos os pedidos e a produção de todos os seus efeitos, ou conforme o autor pretenda a procedência de todos os pedidos mas apenas a prestação que um demandado ou um terceiro escolher ou conforme o demandante formule um pedido principal e um subsidiário para o caso do primeiro não proceder, respectivamente.
Todos estes tipos de cumulação são possíveis ao abrigo do referido artigo 4º CPTA. Mas não menos importante, desta feita em sede de acção administrativa especial é o artigo 47º.
Contudo, antes de desenvolvermos o seu regime, cabe ainda fazer referência aos requisitos presentes nos artigos 5º e 21º CPTA. De facto, se de entre os vários pedidos houver um que, numa acção sem cumulação, seguisse a forma de acção especial, então toda a acção, com todos os pedidos cumulados, seguirá a forma de acção especial (5º/1). Por outro lado, quanto à competência do tribunal há que atender ao disposto do artigo 21º, quando verificamos estar perante uma cumulação de pedidos.
Embora o 5º/1 e o 21º se refiram a requisitos ou critérios formais, o 47º diz respeito a critérios substantivos, nomeadamente a “situações de cumulação que poderão ocorrer no âmbito dos processos que tenham por objecto a prática ou omissão de actos administrativos e que integram a acção administrativa especial” (Mário Aroso de Almeida, Comentário ao CPTA, p. 298).
Decorre deste regime que entre os vários pedidos apresentados pelo autor a cumulação tem que haver uma compatibilidade substantiva ou, na letra do 47º/1, uma “relação material de conexão”. Essa relação ocorre, por exemplo nos casos referidos supra a propósito do artigo 4º.
Após esta brevíssima descrição do regime da cumulação de pedidos, cabe agora fazer referência a uma figura delimitada pelo Prof. Miguel Teixeira de Sousa: a cumulação aparente (Miguel Teixeira de Sousa, Cumulação de pedidos e cumulação aparente no contencioso administrativo in Cadernos de Justiça Administrativa, nº 34 Julho/Agosto 2002. p. 33 e ss). A cumulação aparente diz respeito ao valor da causa. Assim, em princípio, o valor da causa numa situação de cumulação de pedidos afere-se em função da expressão económica de cada um dos pedido, aplicando-se-lhes o artigo 32º/1 a 4 CPTA. Os valores dos pedidos são somados na cumulação simples (32º/7), na alternativa e na subsidiária recorre-se ao critério do 32º/9.
Contudo, nada disto acontece na cumulação aparente. Aqui, parte-se do pressuposto de que cada pedido é economicamente dependente do outro ou respeitem ”a uma mesma e única utilidade económica”. Podem referir-se por exemplo, ao mesmo bem. Veja-se o caso referido pelo Professor (p. 38), da anulação de um contrato cumulada com o pedido de restituição da prestação realizada o seu cumprimento ou reposição da situação que existia antes da realização da prestação. A utilidade económica que o autor retira do pedido de anulação do contrato é a mesma que ele retira da restituição da prestação. É também o caso da cumulação entre o pedido de anulação de um acto administrativo e o pedido de condenação da Administração à prática do acto devido.
Nalguns casos, é a própria lei que consagra a existência de diferentes utilidades económicas, impedindo a cumulação aparente: a esse propósito, o artigo 34º/1 e proémio do 33º CPTA.
Mas quais as consequências desta figura?
Também nos explica o Prof Teixeira de Sousa que no caso da cumulação aparente não se irá dar nenhuma soma dos valores de cada pedido, conforme acontece na cumulação simples, como já vimos. Isto porque a utilidade económica se mantém a mesma: não há dois valores diferentes para somar, o que há é um só, único, correspondente à mesma utilidade que o autor dali retira.
Poderá ainda ter relevância em termos processuais nos casos do 31º/2 CPTA (determinação da forma de processo, da intervenção de tribunal singular ou colectivo, saber se a decisão é recorrível…).
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