quinta-feira, 26 de maio de 2011

Breve Nota ao Processo de Intimação para Protecção de Direitos, Liberdades e Garantias

Existem situações que, em função da natureza urgente, carecem de uma resolução definitiva por via judicial num tempo mais curto, sob pena de inutilidade do pedido. Deste modo, a lei processual administrativa contempla os designados processos urgentes que, enquanto processos principais, visam a pronúncia definitiva de uma sentença de mérito, mediante uma tramitação mais célere.
Os processos principais urgentes, por seu turno, desdobram-se em impugnações relativas a eleições administrativas – artigos 97º e seguintes -, à formação dos contratos elencados no artigo 100º e das intimações para prestações de informações – artigos 104º e seguintes – e para protecção de direitos, liberdades e garantias – artigos 109º e seguintes do CPTA.

Centremo-nos nas intimações para protecção de direitos, liberdades e garantias.
O presente processo de intimação visa, à luz do disposto no artigo 109º, a emissão de uma sentença de condenação, nos termos da qual o tribunal impõe a adopção de uma determinada conduta positiva ou negativa.
Alargando o alcance constitucional de protecção a todo e qualquer tipo de direitos, liberdades e garantias, o presente processo vai mais longe que o artigo 20º, nº5 da Constituição, aplicando-se inclusivamente aos direitos fundamentais da natureza análoga – artigo 17º CRP. Não parece que haja razões que justifiquem restrições na aplicação do regime.
Este reforço de protecção justifica-se pela ideia de existir um risco acrescido associado aos direitos, liberdades e garantias, dado que existe uma maior susceptibilidade de afectação dos mesmos por parte da Administração Pública no exercício dos seus poderes autoritários.
Todavia, não basta a mera invocação genérica de um direito, liberdade ou garantia para que o particular tenha legitimidade para lançar mão da respectiva intimação, como forma de acautelar os seus interesses. É necessário que o processo se revele indispensável para assegurar o seu exercício, em tempo útil, por o eventual decretamento de uma medida provisória não ser possível ou suficiente. Importa ter presente, como observa MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, “a descrição de uma situação factual de ofensa ou preterição do direito fundamental que possa justificar, à partida, ao menos numa análise perfunctória de aparência do direito, que o tribunal venha a condenar a Administração (…) a adoptar uma conduta (…) que permita assegurar o exercício desse direito”.
Note-se que o carácter urgente depende ainda da ponderação das circunstâncias do caso, o que exige ao apreciador o recurso a juízos de valor, mediante uma apreciação, em concreto, do perigo de uma lesão séria para os direitos do particular. Quanto a este último aspecto, parece que da lei resulta que o processo da intimação face ao decretamento de providências tem carácter subsidiário. No entanto, através de uma leitura atenta do nº1 do artigo 109º é possível determinar que sempre que seja necessária uma decisão de fundo urgente, então o processo adequado será sempre a intimação, visto que a mera providência cautelar não tutela o direito em tempo devido. Importa aqui referir a posição preconizada por VASCO PEREIRA DA SILVA, nos termos da qual o particular, tendo conhecimento das circunstâncias objectivas do caso e sabendo que, à partida, o pedido principal não terá qualquer efeito útil, deverá requerer ad initio uma intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias.
Posto isto, os processos de intimação e os processos cautelares encontram-se, em rigor, numa relação de alternatividade.
No que concerne à legitimidade, evidentemente que esta pertence ao titular do direito litigioso, embora VIEIRA DE ANDRADE admita, nestes termos, a legitimidade popular constante do artigo 9º, nº2.
Por fim, uma particularidade subjacente ao regime das intimações para protecção de direitos, liberdades e garantias é que este não se encontra sujeito a prazo de caducidade, desde que verificados os respectivos pressupostos. Ficam, porém, excluídas as violações continuadas ou já concretizadas de direitos fundamentais.

Bibliografia:
            VIEIRA DE ANDRADE, José Carlos; A Justiça Administrativa (Lições), Almedina.

            AROSO DE ALMEIDA, Mário; CADILHA, Carlos Alberto Fernandes; Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina.

Joana Gonçalves, aluna nº17332

PSD de Lisboa diz que anulação de concurso é "oportunidade de ouro" e evita "clamoroso erro" por Lusa17 Setembro 2010

O grupo municipal de Lisboa do PSD defendeu hoje que a anulação do concurso público relativo ao primeiro troço do TGV é "uma oportunidade de ouro" para repensar a alta velocidade e a terceira travessia, evitando "um clamoroso erro".
"O país e Lisboa devem aproveitar a oportunidade que este adiamento criou para se debater e estudar todas as alternativas que permitam a construção da linha de transporte ferroviário de alta velocidade, a custos financeiros suportáveis para o país, sem penalizar Lisboa e a vida dos lisboetas", refere um comunicado da bancada social-democrata na assembleia municipal.
Segundo um despacho hoje publicado em Diário da República, o Governo anulou o concurso público internacional relativo à construção da linha do Transporte da Grande Velocidade (TGV) no troço Lisboa -- Poceirão, uma decisão justificada com a "significativa e progressiva degradação da conjuntura económica e financeira" de Portugal.
Para o PSD, a intenção de avançar com o concurso era uma "decisão precipitada" e integrava uma solução (a da terceira travessia) com uma vertente rodoviária que implicaria "o despejar de mais 70 000 veículos diariamente em circulação na cidade, com custos incalculáveis para a mobilidade e qualidade ambiental".
O grupo considera, por isso, que a iniciativa de adiar uma obra "tão defendida por António Costa" (PS), presidente da autarquia, vem dar razão aos social-democratas.
"A posição do PSD sempre assentou na necessidade de se aprofundar os estudos técnicos sobre a solução apresentada e compará-los com outras alternativas menos onerosas para o erário público, mas, principalmente, menos penalizadoras para a cidade de Lisboa", diz o comunicado.

Execução de sentenças de anulação de actos administrativos

O art 4.º1 do CPC divide as acções em duas grandes categorias, consoante o fim a que se destina: as acções declarativas, que se destinam a compor o conflito de interesses através da declaração, pelo tribunal, do Direito aplicável à solução concreta em litigio. Estas que por sua vez  se subdividem em:
 - acções se simples apreciação, visam apenas que o tribunal declare a existência ou inexistência de um direito ou de um facto, Art. 4.º 2 al. a);
- acções de condenação que se destinam a “exigir a prestação de uma coisa ou de um facto, prevendo ou supondo a violação de um direito”,Art.4.º 2 al.b);
- acções constitutivas que autorizam uma mudança na ordem jurídica existente, Art. 4.º2 al.c);
E as acções executivas (Art.4.º), que tem por finalidade a reparação efectiva dum direito violado, passando-se da declaração concreta da norma jurídica para a sua actuação pratica. Nos termos do Art.45.º1 “toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva”, títulos esses que vem enunciados no Art. 46.º CPC. Para o presente comentário releva apenas a sentença que consiste no” acto pelo qual o juiz decide a causa principal ou algum incidente que apresente a estrutura de uma causa”, Art156.º2 CPC. As sentenças correspondem às espécies de acções supra referidas
O Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) institui três formas de processos executivos:
- O processo de execução para prestação de factos ou de coisas, Arts. 162.º a 169.º;
- O de execução para pagamento de quantia certa, Arts. 170.º a 172.º,
- E o processo de execução de sentenças de anulação de actos administrativos, Arts. 173.º a 179.º;
 Importa advertir para o facto de o CPTA apenas regula as execuções promovidas contra entidades públicas e não contra particulares apesar da execução das sentenças proferidas pelos tribunais administrativos contra particulares correr nos tribunais administrativos mas rege-se pelo disposto na lei processual civil tal como previsto no Art. 157.º nrº 1 e 2.
Este comentário ira apenas incidir sobre a execução de sentenças de anulação de actos administrativos. 
 O Art47.º 2 nas suas alíneas enumera as situações em que é admissível a cumulação em processos de pedido de anulação ou de declaração de nulidade ou inexistência de um acto administrativo. Este preceito permite que logo no decorrer do próprio processo de impugnação de actos administrativos o impugnante proceda a cumulação das pretensões contudo isto consiste numa mera faculdade que não sendo exercida não prejudica a possibilidade de as mesmas serem accionadas no âmbito do processo de execução da sentença de anulação, nr.º 3 do Art47.º. Esta matéria vem posteriormente regulada no Titulo VIII, Capitulo IV que abre com o dever de a Administração executar as sentenças de anulação previsto no Art 173.º. Este que estabelece os parâmetros pelos quais se deve pautar  a actuação que a Administração deve desenvolver quando um acto administrativo tenha sido anulado ou declarado nulo ou inexistente. Esta norma consagra soluções que são aplicáveis tanto no caso em que o impugnante opte por fazer valer as pretensões que emergem da anulação em processo autónomo que seja intentado após a procedência do processo impugnatório, como nos casos em que logo no âmbito do próprio processo impugnatório, opte por cumular com o pedido de anulação pretensões dirigidas à imposição da pratica dos actos e operações que a administração deve adoptar para reconstituir a situação que deveria existir se o acto ilegal não tivesse sido praticado. Pode a Administração cumprir espontaneamente o dever de executar as decisões dos tribunais ou caso isso não aconteça pode o particular recorrer ao regime de execução dessas mesmas sentenças.
No caso de procedência do processo impugnatório de um acto administrativo este pode vincular a Administração a adoptar medidas de:
- Reconstituição da situação que existiria se o acto ilegal não tivesse sido praticado;
- Cumprimento tardio dos deveres que a Administração não cumpriu durante a vigência do acto ilegal pois este acto disso a dispensava;
- Substituição do acto ilegal, sem reincidir nas ilegalidades anteriormente cometidas;
Prevê-se ainda a protecção de terceiros, o beneficiário de um acto consequente tem direito a ser indemnizado pelos danos que lhe cause a eliminação do acto que o favoreça, desde que esse acto tenha sido praticado há mais de um ano e ele desconhecesse sem culpa que a sua conservação na ordem jurídica dependia do destino do acto que veio a ser anulado. Tendo ainda direito a conservar a sua situação jurídica se os danos que para ele resultariam da eliminação do acto que o favorecia forem de difícil ou impossível reparação e manifestamente desproporcionados em relação à utilidade que para o beneficiário da anulação, resultaria da solução contraria. Significa isto que a posição do beneficiário de boa fé prevalece sobre a do interessado que obteve a anulação dando origem a uma situação de causa legitima de inexecução por impossibilidade jurídica de satisfazer as pretensões emergentes da anulação, (Arts.173.º3 e 175.º).
Relativamente à competência para a execução vem prevista no Art 174.º1 sendo da responsabilidade do órgão que tenha praticado o acto este dever de executar a sentença no prazo de três meses caso não haja nenhuma causa legitima de inexecução (Art 175.º1).
Incumprido este dever, pode o interessado dirigir-se ao tribunal, no prazo de seis meses para pedir a condenação da Administração a esse cumprimento (Art 176.º). O processo desencadeia-se mediante a apresentação de uma petição de execução que se distingue das petições referidas nos Arts. 164.º e 170.º2. Consistindo o processo de execução de sentenças de anulação num  processo eminentemente declarativo assim e ao contrario do previstos nos Arts 164.º2 e 170.º2, o interessado na petição não pede a execução ao tribunal, solicitando-lhe que adopte as providencias de execução necessárias para que, no plano dos factos, se produza o resultado que devia advir do cumprimento mas limita-se a fazer valer o seu direito à execução perante o tribunal, indicando os actos e operações em que considera que a execução deve consistir, Art 176.º3.
Uma vez recebida a petição, a entidade demandada e os eventuais contra-interessados são notificados para contestarem no prazo de 20 dias (Art 177.º1). Havendo contestação, o autor pode replicar no prazo de 10 dias (Art 177.º2).
Na hipótese de a pronuncia declarativa não ser cumprida pela administração prevê o Art 179.º a possibilidade de o interessado passar à fase executiva, que dependendo do tipo de obrigação pode conduzir a:
- Um processo de execução para pagamento de quantia certa, Art 179.º4;
- À emissão pelo tribunal de uma pronuncia que produza os efeitos do acto administrativo ilegalmente omitido, Art 179.º5;
- A um processo de execução para prestação de coisas ou de factos, nas configurações que pode revestir face aos Arts. 167.º e 168.º, parecendo isto resultar do Art nr.º 6 do Art179.º.
A fase declarativa do processo culmina, no momento em que o tribunal julga procedente a pretensão do autor, na indicação do conteúdo dos actos e operações a adoptar para dar execução à sentença, fixando o prazo em que devem ser praticados (Art 179.º1). No caso de a Administração incumprir os deveres que lhe foram impostos na fase precedente segue-se uma fase executiva que segue os termos da execução previstos no Art 179.º nrº 4 a 6.


 Bibliografia:
Mário Aroso de Almeida, Manual de Processo Administrativo;
Mário Aroso de Almeida, Código de Processo nos Tribunais Administrativos Anotado;
Vieira de Andrade, A Justiça Administrativa;

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Medidas cautelares – critérios de concessão


Sindicatos entregam providências cautelares para impedir cortes salariais

Noticia: Quarta – feira, 5 de Janeiro de 2011 - Lusa

“Professores e Inspectores da Educação são alguns dos profissionais da função pública que entregam hoje providências cautelares para impedir os cortes dos salários anunciados pelos Governo.

A acção está a cargo de cada um dos sindicatos que representam estes profissionais assim como de outros da administração pública que escolheram o dia de hoje para avançar com as providências cautelares nos tribunais administrativos.

Os cortes salariais vão de 3,5% a 10% do salário e aplicam-se a quem ganhe mais de 1.500 euros por mês na Administração Pública e no sector empresarial do Estado.

(…)

Educação: providências cautelares antecipatórias

No sector da Educação, os sindicatos da Federação Nacional dos Professores (Fenprof) vão interpor providências cautelares antecipatórias para evitar que se concretizem os cortes salariais, até que haja "uma decisão sobre a sua legitimidade, legalidade e constitucionalidade(…)".

O CPTA consagra o princípio de que todo o tipo de pretensões podem ser objecto de um processo principal. O amplo leque de pretensões substantivas que os particulares podem accionar, a título principal, perante os tribunais administrativos passa pela possibilidade de obter providências cautelares verificando-se o seu conteúdo em função da necessidade de cada caso.

O art. 112º do CPTA consagra uma cláusula aberta por força da qual “ quem possua legitimidade para intentar um processo junto dos tribunais administrativos pode solicitar a adopção da providência ou das providências cautelares, antecipatórias ou conservatórias, que se mostrem adequadas a assegurar a utilidade da sentença a proferir nesse processo”.

O art. 112º nº2 admite que as providencias cautelares a adoptar possam ser as providencias típicas que se encontrem especificadas no CPC, com as adaptações que se justifiquem. E apresenta um elenco exemplificativo de outras providências que podem ser adoptadas.

O nº1 do artigo 112º refere as providências antecipatórias e conservatórias. É uma distinção de extrema importância visto serem diferentes os critérios de que, nos termos do art. 120º nº1, depende a adopção de uma ou outra.

As providências cautelares conservatórias, tal como o adjectivo sugere, visam acautelar o efeito útil da acção principal, assegurando a permanência da situação existente aquando da ocorrência do litígio a dirimir na acção principal. As providências conservatórias têm, assim, como finalidade manter o statu quo; perante a ameaça de um dano irreversível, destinando-se a manter inalterada a situação que preexiste à acção, acautelando tal situação, de facto ou de direito, evitando alterações prejudiciais, até que a questão de fundo seja dirimida no processo principal.

As providencias cautelares antecipatórias visam prevenir um dano, obtendo antecipadamente a disponibilidade de um direito ou gozo de um benefício a que o particular pretende ter direito, mas que lhe é negado. Ou seja, visam dar resposta a interesses cuja satisfação no processo principal, dependa da emissão de sentenças que determinem ou imponham uma alteração da situação pré – existente. Sendo exemplos as alíneas b), c) e d) do nº2 do art. 112º.

Critérios gerais de concessão de providências cautelares – o periculum in mora, o fumus boni iuris e a ponderação de interesses.

Das alíneas do art. 112º, as alíneas a) e, e) são objecto da regulação especifica dos artigos 128º a 134º. E ainda aí, só pontualmente encontramos (nos artigos 129º, 132º nº6, e 133º nº2 a previsão de um regime próprio quanto aos pressupostos de que depende o decretamento das providencias.

Ora, daqui resulta que os critérios de que depende a concessão das providências cautelares são quase unitariamente definidos no art. 120º. O nº1 deste artigo estabelece nas alíneas b) e c), critérios diferenciados, consoante se trate de conceder providências conservatórias ou antecipatórias.

1. O regime regra decorre das alíneas b) e c) nº1 do art. 120º, nos termo dos quais a concessão das providências cautelares depende da demonstração do periculum in mora, que o código articula com o critério do fumus boni iuris.

Por periculum in mora define-se o receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para o requerente; e o fumus boni iuris que não seja manifesta a falta de aparência do bom direito.

Tendo em conta que os demais pressupostos de que nos termos do art. 120º depende a concessão de providência foram observados, ela deve ser concedida sempre que “haja fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar ou pretende ver reconhecidos no processo principal. Do ponto de vista do periculum in mora as providencias cautelares devem ser atribuídas em dois tipos de situações:

- quando os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio de que, se a providencia for recusada, se tornará depois impossível, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente, proceder à reintegração, no plano dos factos da situação conforme à legalidade.

- quando, embora não seja de prever que a reintegração, no plano dos factos, da situação conforme à legalidade se tornará impossível, os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio de que, se a providência for recusada, essa reintegração no plano dos factos será difícil, no caso de o processo principal vir a ser julgado procedente, por já não ser possível evitar a ocorrência de danos especialmente graves.

Outro critério baseia-se na apreciação perfunctória e provisória, por parte do juiz, da consistência, e portanto, da credibilidade da pretensão que o requerente faz valer no processo principal.

Providencia cautelar conservatória vs antecipatória:

No caso de estar em causa uma providencia cautelar conservatória o art. 120º nº1 b) determina que uma vez demonstrado o periculum in mora será concedida a menos que “seja manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular [no processo principal] ou a existência de circunstâncias que obstem ao seu conhecimento de mérito”.

Já caso esteja em causa a concessão de uma providencia cautelar antecipatória, a alínea c) no mesmo artigo estabelece que, ainda que demonstrado o periculum in mora, a providencia só será concedida quando seja de pensar “que a pretensão formulada ou a formular pode vir a ser julgada procedente”. Atribui-se aqui relevo ao fumus boni iuris: se o requerente pretende, ainda que a titulo provisório, que as coisas mudem a seu favor, sobre ele impende o encargo de fazer prova perfunctória do bem fundado da pretensão deduzida no processo principal.

2. Do art. 120º nº2 decorre o terceiro critério, a ponderação de interesses, públicos e privados. Sendo a providência recusada quando essa ponderação demonstre que “ os danos que resultariam da sua concessão se mostram superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências”.

A justa comparação de interesses exige que o tribunal proceda à ponderação equilibrada dos interesses, contrabalançados os eventuais riscos que a concessão da providência envolveria para o interesse publico com a magnitude dos danos que a sua recusa poderia trazer para o seu requerente. Está aqui em causa o princípio da proporcionalidade, o da proibição do excesso.

Urgência do 109º CPTA ou Providência do 131º CPTA?

Após a revisão constitucional de 1997, o legislador administrativo viu-se obgrigado em matéria de direitos, liberdades e garantias, a adoptar, em conformidade com a Lei Fundamental, um novo meio processual, com vista a consagrar o principio da tutela jurisdicional efectiva preceituado no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa (CRP) , nascendo, o processo urgente de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias do artigo 109º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA).
O artigo 109º CPTA, constitui um processo urgente principal em matéria de protecção de direitos, liberdades e garantias.

Os processos urgentes principais, são processos autónomos, caracterizados por uma tramitação acelerada ou simplificada, considerando que estão em jogo questões/situações cuja resolução à partida deve ocorrer num “tempo curto” , não compatível com o tempo considerado normal para a generalidade dos
processos.
Estes processos, ao contrário dos cautelares, decidem definitivamente o mérito da causa,ou seja, desembocam em decisões judiciais definitivas quanto ao seu mérito, dada obviamente a celeridade com que no caso, se impõe alcançar a justa composição de todos os interesses envolvidos.
Por sua vez, a tutela cautelar , é caracterizada pela sua acessoriedade ou instrumentalidade face ao processo principal, pretendendo-se que através de medidas conservatórias ou antecipatórias, seja provisoriamente regulada a situação em termos de se poder assegurar a utilidade da sentença em tempo dito normal.

A relação entre processos urgentes e providências cautelares pode vislumbrar-se, sobretudo, no âmbito do artigo 109º CPTA, que no seu nº1 remete para o artigo 131º do CPTA, transmitindo uma ideia de subsidiariedade entre ambos os artigos e ambas as formas de tutela processual em sede de contencioso administrativo.

A doutrina questiona-se, todavia, ainda que a letra da lei pareça clara, se o espiríto do diploma legal proporciona uma verdadeira subsidiariedade entre ambos os meios de tutela administrativa ou se pretende, ainda que com uma redacção algo infeliz, estabelecer uma alternatividade entre ambas as acções processuais.

Segundo o artigo 109º CPTA, o recurso ao processo urgente de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias exige ,desde logo, como pressuposto
a urgência da decisão para evitar a lesão ou inutilização do direito. Simultaneamente, exige, ainda, que no caso concreto, não seja de facto possível ou suficiente para assegurar o exercício desses direitos, o decretamento provisório de uma providência cautelar,segundo o disposto no artigo 131º.
O requerente da intimação terá que alegar e provar (ainda que de forma sumária) que só a procedência do pedido de intimação lhe proporcionará a plenitude do exercício do seu direito, demonstrando assim a indispensabilidade da intimação, face ao caso concreto.

Assim, ao contrário, do que seria de esperar face ao supracitado, o meio urgente, concretizador da tutela efectiva dos direitos fundamentais, não surge como via principal face á defesa dos direitos, liberdades e garantias de todos e cada um, parecendo estar sempre dependente, na sua aplicação, da não verificação da possibilidade de recurso a uma acção administrativa comum ou especial, conforme o caso, “coligada” com uma acção cautelar, destinada a salvaguardar os direitos em apreço.

Todavia, tal não é nem poderá ser tão linear quanto a letra da lei nos faria acreditar.
Ainda que a providência cautelar do 131º surja como o meio defesa preferencial, a verdade é que, será sempre necessário analisar o caso concreto e perceber o que se pretende com a acção colocada, pois muitas vezes a providência cautelar poderá ser utilizada num sentido e com um objectivo díspare da sua própria natureza, sendo instaurada como forma de obtenção de uma decisão definitiva, que uma vez proferida, fará com que não exista qualquer interesse no seguimento de um processo de reconhecimento de direitos principal.
Lançar mão desta subsidariedade do 109º do CPTA para fazer da providência cautelar uma forma de obtenção de uma decisão de mérito, em detrimento do processo urgente, seria confundir os papéis que cada uma das acções possui no nosso contencioso administrativo, desvirtuando o que o legislador pretendera ao criar este elo de ligação entre ambas as tutelas jurisdicionais de direitos, liberdades e garantias de forma célere.
Assim, sempre que esteja em causa urgência na decisão, mas a decisão pretendida seja uma decisão de mérito, uma decisão que, uma vez proferida, não confira qualquer interesse no prosseguimento de uma outra acção dita principal, não poderá ser nunca, a providência cautelar o meio de agir, não se podendo nunca equacionar como legítimo o recurso á última parte do nº1 do artigo 109º do CPTA de modo a afastar a acção urgente de intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias.

O processo urgente do 109º do CPTA funcionará, segundo o exposto, em alternatividade, mais do que subsidiariedade pura com o artigo 131º do CPTA ou, até mesmo, com qualquer providência cautelar específica destinada a tutela de direitos, liberdades e garantias, pois será possível ser o processo urgente, á luz do caso concreto, o único meio processual utilizável e admissível á satisfação da pretensão do requerente.
Caminhará, assim, a urgência do 109º do CPTA lado a lado com a provisoriedade do 131º do CPTA, não se encontrando sempre, ao contrário do que a redacção legal suscitaria na retaguarda desta última.

Bibliografia:
Vieira de Andrade, “A Justiça Administrativa”, Almedina, 2008
“Comentário ao Código de Processo dos Tribunais Administrativos”, Almedina, 2005
Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Cadilha, “Comentários ao Código de Processo dos Tribunais Administrativos”

Diana Pinto
Nº17257

Visita Guiada Às Medidas Cautelares

Os processos cautelares passaram de uma situação catastrófica não tendo efectivamente aplicação nenhuma, principalmente nos actos negativos, para na actualidade terem uma aplicação excessiva.
Causa importante desta alteração foi o facto de a Constituição ter passado a prever expressamente no seu art268/4º como dimensão do princípio da tutela a protecção cautelar adequada.
Cabe agora atender às características típicas da tutela cautelar. Tendo os processos cautelares o objectivo de garantir o tempo necessário para se fazer justiça, necessidade de se assegurar a utilidade da sentença que venha a ser proferida, não choca que as características essenciais das medidas cautelares sejam a instrumentalidade, provisoriedade e sumariedade.
A instrumentalidade é a característica que distingue processos urgentes de medidas cautelares. As medidas cautelares estão sempre associadas a um processo principal, como já disse, apenas visam garantir o efeito útil da decisão final. No fundo consiste na dependência de uma acção principal, cuja utilidade visa garantir.
Quanto á provisoriedade entende-se que com a decisão final deixa de ser necessário o procedimento cautelar, pois não estar em causa a resolução definitiva de um litigo.
Relativamente à sumariedade defende-se que o juiz que profere a decisão, não tem a capacidade, nem o dever, de apreciar todos os elementos do processo como se de um processo principal se trata-se. Decorre na necessidade de uma solução rápida própria de um processo provisório e urgente.
Continuando a nossa visita pelos meios cautelares é necessário fazer paragem no art112º do CPC. O artigo em questão dá a título exemplificativo um catálogo muito extenso passível de servir de base a providências cautelares. No fundo estamos perante um catálogo aberto.
Em sede deste artigo importa fazer a distinção entre meios cautelares antecipatórios, têm por objecto antecipar a pretensão ou seja antecipar a decisão, prevenir um dano, obtendo adiantadamente a disponibilidade de um bem ou o gozo de um benefício a que o particular pretende ter direito e os meios conservatórios que visam conservar uma certa situação/ pretensão. Anteriormente às alterações já referidas, apenas se previam no CPTA meios cautelares conservatórios.
Importa também fazer referência aos artigos 114º, 119º e 123º do CPTA, relativamente ao momento e forma do pedido, assim como aos prazos e a respectiva caducidade.
Outro artigo muito relevante é o art120º do CPTA, pelo facto de prever os pressupostos a atender pelo juiz para acautelar as pretensões dos particulares.
Para um estudo mais claro importa separar a analise das alíneas a), b) e c).
A alínea a) reporta-se a situações manifestas de procedência da pretensão formulada pelo particular, sabe-se à partida que a decisão final vai ser nesse sentido.
Esta alínea caracteriza-se pelo facto de não ser exigido periculum in mora, é irrelevante se vai ou não haver prejuízo/ dano iminente, devido à manifesta existência de fumus boni iuris. Também não se exige proporcionalidade.
Relativamente à alínea b) exige-se um equilíbrio entre o periculum in mora e o fumus boni iuris. O professor Vieira de Andrade entende que o fumus boni iuris neste preceito está formulado na negativa, quando se refere no artigo “não seja manifesta a falta de fundamentação”.
Pelo contrário na alínea c) temos o fumus boni iuris na sua plenitude formulado pela positiva.
Outra questão que importa trazer à colação nesta visita guiada é a proveniente do art120º/2 do CPTA, relativa à necessidade de ponderação de interesses.
Anteriormente pensava-se que se reportava exclusivamente à ponderação de interesses públicos, o que ajudava a agravar ainda mais o desequilíbrio entre a administração (agressiva) e os particulares.
Actualmente entende-se que a ponderação aqui em causa reporta-se essencialmente a questão de ponderação de danos. A uma ponderação no caso concreto do prejuízo para ambas as partes.
O Prof. Vieira de Andrade apoia-se na letra da lei, mais concretamente na expressão “em presença”, para se admitir uma ponderação em concreto e não em abstracto.
No fundo o que se pretende é uma avaliação por parte do tribunal numa perspectiva do dano causado, uma avaliação de danos no caso concreto.
Quanto aos aspectos processuais importa atender aos arts128º, 131º, 132º, 133º, 134º e 142º do CPTA.
Tem-se então por concluída a nossa breve viagem aos meios cautelares.

Ana Pascoal
Nº 17573

A impossibilidade de decretamento provisório de uma providência cautelar no art. 109.º CPTA

Como se sabe, a grande diferença entre processos urgentes, nos quais se destaca a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, e processos cautelares prende-se com o facto de os primeiros não estarem interligados com o processo principal. De facto, estes visam o proferimento de uma decisão de mérito e definitiva, enquanto nas providências cautelares o que temos é uma situação provisória, dada que será a sentença da acção principal que resolverá definitivamente a questão. Assim uma das características das providências cautelares é a provisoriedade.

Cabe agora analisar a questão a que o título do nosso trabalho faz referência. Como tal, um dos requisitos para que a intimação acima referida possa ser adoptada prende-se com a impossibilidade de ser decretada provisoriamente uma providência cautelar.

Este decretamento provisório vem previsto no art. 131.º do CPTA e é utilizado quando se esteja perante situações em que a urgência é tal que se permite que uma providência cautelar seja decretada logo após se ter apresentado o pedido relativo à adopção da providência. O n.º 1 refere o caso em que a referida providência se destine a proteger direitos, liberdades e garantias.

Posto isto pergunta-se quando se deve recorrer a um decretamento provisório e quando se deve adoptar a via do processo urgente, nomeadamente a intimação para direitos, liberdades e garantias.

A opção entre uma e outra está intimamente relacionada com a própria configuração (ou diferença de configuração) entre um procedimento cautelar e um processo urgente. Em primeiro lugar temos que estar perante uma situação de grande urgência, quer na primeira, quer na segunda situação. Não podemos estar assim perante situações a que se permita dar resposta através do processo comum. Tem que haver uma grande necessidade de especial celeridade e prioridade na resolução do litígio, sob pena de o direito – neste caso um direito, liberdade e garantia nos termos da Constituição, não poder ser mais acautelado por não se ter actuado atempadamente. Este é o grande ponto em comum.

Contudo para se optar entre um e outro tem que se avaliar o que se pretende – ou uma decisão de mérito ou uma decisão provisória que permita a protecção do direito até ao julgamento da causa em sede de processo principal. Se a questão de mérito não se compaginar com uma demora deve-se optar pela intimação para direitos liberdades e garantias, nos termos do art. 109.º ss. Apesar de esta não ser a via comum de defesa dos direitos, liberdades e garantias, pois essa é a do processo comum, e apesar de ainda se ter de passar pelo crivo de não ser aplicável uma providência cautelar, a intimação constitui um meio que permite obter, rapidamente, uma decisão de fundo sobre uma situação em que estão em causa direitos de particular importância para o ordenamento jurídico português.

O Dr. Jorge Guerreiro Morais fala aqui de uma dupla subsidiariedade. De facto considera que o requisito de impossibilidade de decretamento da providência e a insuficiência da providência por não conferir uma decisão definitiva consubstanciam o primeiro patamar. O segundo prende-se com o facto de só se recorrer à intimação se não se puder lançar mão de qualquer outro meio que permita tutelar adequadamente o direito em apreço.

O que dizer da opção do legislador de adopção desta subsidiariedade?
Em primeiro lugar surge a questão de se estar efectivamente perante uma subsidiariedade dado que o que é certo é que o campo de aplicação do decretamento provisório de providência e da intimação não é o mesmo pois esta última apenas é aplicada quando a decisão da causa não se compadeça com uma mera decisão provisória. De qualquer modo, crê-se que se deve atender ao caso concreto como exige o próprio art. 109.º, procurando lançar-se mão do meio que se apresente como o mais adequado.
De facto, o que se pretende é a protecção daqueles direitos que são pela Constituição considerados como um dos pilares do Estado de Direito.



Inês Santos n.º 17317

Bibliografia

Andrade, José Vieira de, A Justiça Administrativa – lições, Coimbra, Almedina, 2009;
Morais, Jorge Guerreiro, A sensibilidade e o bom sensu no Contencioso Administrativo, Lisboa, 2007;
Roque, Miguel Prata, Reflexões sobre a reforma da tutela cautelar administrativa, Almedina, Lisboa, 2005.