segunda-feira, 16 de maio de 2011

Acção administrativa comum




O âmbito de aplicação da acção administrativa comum encontra-se delimitado pelo art. 37º do CPA, referindo o professor Vasco Pereira da Silva que a aparente delimitação por exclusão de partes, segundo a qual pertenceriam ao âmbito da acção administrativa comum “todos os processos não especialmente regulados” assenta num critério substantivo. Nas palavras do regente, a acção administrativa comum é uma “acção- quadro”, a qual abrange uma grande diversidade de pedidos ( desde as acções de livre apreciação [as alíneas a) e b)], às de condenação [ as alíneas c), d), e), f), g)], passando por outros de natureza mista, em que se combinam as vertentes de simples apreciação, com as constitutivas ou de condenação [ as alíneas h), i), j)].
Para o professor Viera de Andrade, a delimitação terá de ser feita pela negativa, assim: a acção administrativa comum será, em regra, o meio adequado de acesso à justiça administrativa, se não estiver em causa um litígio relativo à prática ou omissão de actos administrativos impugnáveis ou de normas.
Da análise do art. 37º/2, cujo elenco o regente conclui ser exemplificativo, resulta a aplicação da forma da acção administrativa comum às acções tradicionais (acções sobre contratos e sobre responsabilidade) e a um conjunto de litígios, entre os particulares ou as próprias entidades públicas contra a Administração, em relação a diferentes situações, identificando os casos mais importantes. Da exemplificação referida, resulta a sua aplicação às acções de reconhecimento ou de simples apreciação (no entanto o regente critica a alínea b), por entendê-la desnecessária, pois na maior parte dos casos essas hipóteses já estariam previstas na alínea anterior), a acções impositivas e acções inibitórias (pedido de condenação à adopção ou abstenção de comportamentos); além disso, consta do elenco do art. 37º/2 a possibilidade dos particulares pedirem a condenação da Administração à não emissão de um acto administrativo, quando se preveja a emissão de um acto lesivo. Contudo, o professor Viera de Andrade defende que este pedido deve ser utilizado de forma limitada, não só pela natureza do nosso sistema, de administração executiva, em que os órgãos competentes só podem praticar actos administrativos, oficiosamente ou a requerimento e o particular tem a possibilidade de impugnar posteriormente o decidido. Assim sendo, este pedido deverá, apenas, ser utilizado, perante a inadequação ou a impossibilidade ou a deficiência da tutela própria dos particulares através da acção administrativa especial. O professor conclui dizendo que a avaliação do interesse em agir, decorrente da inadequação ou da insuficiência da utilização do meio impugnatório contra o acto que eventualmente viesse a ser praticado, caberá sempre à jurisprudência (e só se justificará se a impugnação posterior do acto não garantir uma tutela eficaz dos direitos do particular).
O regente defende, por seu lado, que o pedido de condenação à adopção de um acto administrativo não deve seguir a forma de processo da acção comum, mas antes especial (na modalidade de condenação à prática de acto administrativo devido, art. 66º e ss. do Código), sob pena de deixar de fazer sentido o critério de delimitação dos meios processuais (arts. 37º e 46º).
Falta, ainda, referir, relativamente ao elenco estabelecido no art. 37º/2: as acções de restabelecimento (d), dirigidas necessariamente contra a Administração, com o objectivo de restabelecer direitos ou interesses violados por ela (o pedido de restabelecimento pode ser cumulado com um pedido de indemnização numa acção de responsabilidade); as acções de prestação, pode utilizar-se a acção comum para pedir a condenação da Administração no cumprimento de deveres de prestar, decorrentes directamente de normas administrativas, desde que não envolvam a prática de um acto administrativo e podem ter por objecto o pagamento de uma quantia, a entrega de uma coisa ou a prestação de um facto [alínea e)];as acções de reposição, designadamente os pedidos de reintegração patrimonial decorrentes do enriquecimento sem causa administrativo e da imposição de sacrifícios por razões de interesse público [as alíneas g) e i)], a lei refere, também, as acções contra particulares, no âmbito das quais qualquer pessoa ou entidade pode pedir a condenação da Administração à adopção ou abstenção de comportamentos por particulares, com fundamento na violação ou fundado receio de violação de “vínculos jurídicos administrativos”, quando a Administração não tenha tomado as medidas adequadas, o que pressupõe o requerimento prévio que lhe seja dirigido e o decurso de um prazo razoável, para se poder provar que ela não agiu. Por fim, o art. 37º prevê a aplicação da forma de acção comum às relações jurídicas entre entidades administrativas, o que se justifica face à complexidade organizacional da Administração Pública e à multiplicação de entes jurídicos públicos.
O nº 3 do art.37º está, sobretudo, pensado para processos entre particulares, ainda que se possa incluir a acção por parte de entidades públicas (“qualquer pessoa ou entidade”), quando essa entidade não seja a autoridade competente. O professor Vieira de Andrade dá o exemplo do município contra violação pelo particular de 1 dever cujo cumprimento incumbe ao Estado assegurar. 
O professor Viera de Andrade entende que se deve estender a aplicação da forma de acção comum aos casos em que as autoridades públicas peçam aos tribunais providências contra particulares, seja, por exemplo, em matéria de contratos, em que a Administração e particulares estão em igualdade, seja porque há dúvidas quanto ao conteúdo da prestação e, nessa situação, não deve ser a Administração a definir o seu conteúdo através de acto administrativo. 

Brígida Viegas

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